ONU: NAZISMO NO BRASIL
- HumanizaSC
- 5 de jun.
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ONU cobra ação por aumento de células neonazistas no Brasil

Por: Jamil Chade no UOL
A relatoria da ONU sobre racismo soa o alerta sobre a disseminação de células neonazistas no Brasil. Num documento enviado a todos os governos e que será alvo de um debate no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, em julho, a investigação cobra as autoridades do país para que atuem para identificar e punir esses grupos.
O documento foi preparado pela relatora especial sobre formas contemporâneas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata, Ashwini K.P.
Ela esteve no Brasil em 2024, visitando Brasília, Salvador, São Luís, São Paulo, Florianópolis e e Rio de Janeiro.
Durante a missão, a relatora se reuniu com mais de 120 representantes de comunidades e grupos da sociedade civil.
O centro de seu informe - primeiro publicado pelo Instituto Brasileiro de Direitos Humanos - é a denúncia de um "racismo sistêmico" no país. Mas um dos destaques, desta vez, é o alerta sobre a proliferação do ódio.
De acordo com o documento, uma "tendência preocupante que contribui para o ódio racial, incluindo o ódio online, é o aumento do número de células neonazistas nos estados do sul do Brasil, incluindo Santa Catarina".
"O neonazismo e outras formas de extremismo de direita são perigosos impulsionadores do racismo e de outras formas semelhantes de ódio e intolerância", disse.
No informe, ela descreveu alguns dos processos criminais e investigações relacionadas ao neonazismo no Brasil. Isso incluiu:
Um incidente de violência escolar em que o agressor usava uniforme militar e uma suástica em suas roupas;
Grafites nazistas pintados em ambientes educacionais;
Ameaças, incluindo referências nazistas, feitas em ambientes educacionais;
Uma empresa que fabricava bens que glorificavam o nazismo;
e indivíduos com afiliações ao neonazismo e ideologias associadas que foram implicados em crimes violentos.
A denúncia não se refere apenas aos casos específicos. No documento, a relatora se diz "preocupada com a apatia em relação às tendências do neonazismo demonstradas por funcionários do Estado e pelo governo nos estados afetados, como Santa Catarina".
"Ela saúda o estabelecimento pelo Conselho Nacional de Direitos Humanos de uma Relatoria Especial para o Combate ao Crescimento de Células Neonazistas no Brasil, mas pede mais ações", aponta.
Entre as recomendações, da ONU cobra o governo a:
Assegurar que todas as formas de discurso de ódio incluídas no artigo 4.º da Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial sejam incluídas no quadro jurídico nacional e alargar a aplicação de medidas legais e não jurídicas para prevenir e combater o discurso de ódio racista, incluindo quaisquer incidentes que possam constituir incitamento à discriminação, hostilidade ou violência;
Prosseguir e intensificar os esforços para trabalhar com empresas privadas de tecnologia para fazer face à crescente incidência de discursos racistas de ódio em linha e colmatar quaisquer lacunas nos quadros jurídicos vinculativos para fazer face a esses fenômenos;
Tomar medidas concretas nos níveis federal e estadual para combater o crescente número de células neonazistas, particularmente em estados do sul, como Santa Catarina;
De acordo com a entidade, os "fatores que impulsionam o racismo cotidiano e os estereótipos endêmicos também contribuem para níveis preocupantes de discurso de ódio racista, incluindo discurso de ódio online e crimes de ódio".
Usando dados públicos, a entidade cita 13.897 casos de abuso racial e 11.610 casos de racismo foram relatados em 2023. "Apesar desses números preocupantemente altos, as taxas de acusação e condenação permanecem baixas", alertou.
Racismo sistêmico
Em outros trechos do informe, a relatora afirma que embora reconheça elementos positivos na resposta do governo do Brasil ao racismo e à discriminação racial, "ficou evidente que pessoas afrodescendentes, povos indígenas, comunidades quilombolas, ciganos e pessoas de outros grupos raciais e étnicos marginalizados no Brasil, incluindo aqueles que enfrentam discriminação interseccional com base na deficiência, gênero, status de lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros ou intersexuais e/ou status de migrante ou refugiado continuam a experimentar manifestações multifacetadas, profundamente interconectadas e generalizadas de racismo sistêmico".
Violência policial
No documento, a relatora afirma que recebeu "relatos chocantes do uso endêmico do uso excessivo e letal da força por agentes da lei brasileiros, particularmente contra afrodescendentes. Essa violência inclui incidentes frequentes de batidas policiais altamente militarizadas realizadas em favelas por policiais de várias entidades de segurança do Estado, incluindo militares, policiais civis e policiais rodoviários federais".
"Essas incursões, ostensivamente destinadas a restringir as atividades dos cartéis de drogas, muitas vezes empregam técnicas de policiamento altamente militarizadas envolvendo tiros de metralhadora pesados e indiscriminados em áreas civis densamente povoadas", alerta.
"Isso frequentemente resulta na morte e ferimentos de moradores, que são predominantemente civis afro-brasileiros, incluindo mulheres grávidas e crianças. Os policiais também foram acusados de outras formas graves de violência, incluindo violência sexual e agressão contra afrodescendentes durante batidas em favelas", disse.
"As violações secundárias de direitos humanos resultantes dessas invasões também são significativas, pois interrompem a educação, a saúde e outros serviços essenciais que estão nas proximidades das favelas e causam danos à propriedade das pessoas", afirmou.
Sua avaliação é de que uma "mudança de paradigma mais significativa é urgentemente necessária para garantir um maior foco na abordagem das causas profundas da brutalidade policial sistêmica na aplicação da lei".
"Essa mudança é necessária para reduzir a militarização do policiamento civil e garantir que o uso da força seja empregado em estrita conformidade com os princípios de proporcionalidade, necessidade e legalidade e com os padrões internacionais de direitos humanos relacionados à igualdade racial", concluiu
Ela ainda defende o uso de câmeras corporais por agentes da lei como "passo que pode reduzir a violência policial, de acordo com organizações da sociedade civil".
"A Relatora Especial está, no entanto, alarmada com relatos de que, em muitos dos estados que visitou, esses equipamentos nem sempre são usados de forma eficaz. Ela pede o uso consistente e eficaz de câmeras corporais por todas as agências de aplicação da lei como um importante passo intermediário que deve ser implementado juntamente com outras medidas para garantir justiça e responsabilização para as vítimas de brutalidade policial, bem como abordagens mais transformadoras para desmantelar o racismo sistêmico na aplicação da lei", completou.

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