A escola não é uma instituição isolada do contexto. O que nela ocorre está dialeticamente articulado à dinâmica da totalidade da vida social
Por Marcos Francisco Martins*
Este artigo visa a apresentar uma resposta à pergunta expressa no título e, para tanto, guarda uma articulação textual dividida em três partes. Na primeira e mais longa delas, é apresentado o “caldo” econômico, político-ideológico, cultural e social, no âmbito internacional e nacional, que deu e dá sustentação aos ataques contra escolas. Além disso, são definidos os traços gerais das “narrativas”, palavra da moda, comparando-as com o “discurso” (Quadro 1), com vistas a indicar, didaticamente (Quadro 2), que escolas estão sendo atacadas porque são entendidas pelos neofascistas [i] como polo opositor às pautas que eles (as) defendem.
Na segunda parte, é feita a diferenciação entre “violência nas escolas” e “violência contra escolas” (CARA, 2022), inclusive, citando dados quantitativos para sustentar os argumentos.
Na terceira e última seção textual, há orientações para combater as violências “nas” e “contra” escolas, indicando iniciativas a serem desenvolvidas pela sociedade, Secretarias de Educação, escolas e pais e/ou responsáveis.
Conclui-se que os referidos ataques não são uma “natural” disfunção social, mas estratégia de neofascistas para criar problemas e apresentar soluções coerentes às pautas que defendem.
Por que escolas são o alvo preferido de ataques neofascistas?
Dos ataques deferidos contra escolas no Brasil recentemente, surge a dúvida: por que elas foram escolhidas como alvo e não outro espaço qualquer? Essa não é questão simples, mas merece o esforço heurístico em busca de resposta, porquanto dela depende a existência de alunos(as) e profissionais da educação, como também a frágil civilidade democrática brasileira.
Para esboçar uma resposta, inicialmente, importa dizer que a escola não é uma ilha. Ela integra uma totalidade, um contexto maior, formado por vários elementos interconectados, inter-relacionados, intercomunicantes, ou melhor, que mantém entre si relações de reciprocidade, dialéticas. De modo que, para compreender o que está a ocorrer com as escolas, é inexorável entender o contexto que compõe o cenário atual, particularmente, o das últimas décadas.
Assim como pregressamente, as mudanças recentes da vida social foram resultantes de articulados processos econômicos, políticos, sociais e culturais [ii] vividos no contexto. Cabe dizer que, internacionalmente, a economia colaborou para produzir diversas instabilidades, mormente no mundo do trabalho, deixando a juventude sem perspectiva de vida digna. O toyotismo e a flexibilização/integração das cadeias produtivas desenvolveram-se em cenário de crises capitalistas, cujo rumo foi dado pelo neoliberalismo, ao qual o mercado é o demiurgo do mundo e tudo transforma em mercadoria. Está correta Kuenzer (2004) ao dizer que é a dualidade estrutural da “exclusão includente” e “inclusão excludente” que se vive: a primeira refere-se ao universo do trabalho, que exclui trabalhadores(as) da formalidade e os(as) inclui na informalidade; a segunda reporta-se à educação, que inclui massas nas escolas e as formam sem dar acesso aos conhecimentos historicamente produzidos pela humanidade e sintetizados pela ciência, filosofia e artes, e com objetivo voltado ao mercado (informal!), ao empreendedorismo, por exemplo.[iii]
Esse processo econômico-educativo foi acompanhado, politicamente, pela emergência de movimentos como o neofascismo, que têm articulação internacional. Uma das facetas desse autoritário e obscurantista movimento, que já foi regime político, é o ultra-conservadorismo nos “costumes”, que se manifesta na forma de racismo, misoginia, homo e transfobia, e assume o ódio e a violência como mediação das relações sociais.
Culturalmente, isto é, em relação à modificação da “mentalidade coletiva”, destaca-se a ascensão do fundamentalismo religioso, em especial, o cristão. Além disso, importa destacar o movimento pós-moderno que, controverso,[iv] trouxe a incerteza ao conhecimento científico e filosófico, concebe como “líquido”, flexível, os valores e ataca concepções de mundo integrais (“metanarrativas” – LYOTARD, 1993), validando apenas asserções particulares e, assim, entende que todas as narrativas sobre os fatos têm o mesmo status de confiabilidade.
Narrativa é uma forma de descrever, julgar e interpretar os fenômenos,[v] e todas ganham o mesmo grau de verdade sob a ótica pós-moderna. Mas nem toda descrição, julgamento e interpretação de um fato é narrativa, porque também pode ser um discurso. Embora sejam palavras próximas na linguagem coloquial, narrativa e discurso guardam diferenças importantes.
Quadro 1 – Comparação entre narrativa e discurso
Fonte: produzido pelo autor do artigo
Por meio de narrativas, foi imposto a grupos sociais em todo mundo o negacionismo científico, o movimento antivacina e a descrença de que o meio ambiente está em risco com o avanço sem limites da destruição capitalista. Por elas, no Brasil, muitos(as) acreditaram que Haddad havia distribuído um “Kit gay” às escolas e outros(as) convenceram-se e estão tentando convencer alguns(mas) que os atentados de 08/01/2023, que destruíram as sedes dos três poderes da República brasileira, foram maquinados pelo PT, por Lula e o governo dele.
A propósito, sobre o contexto nacional, importa afirmar que as Jornadas de Junho de 2013 abriram brechas para que o neoliberalismo, que estava aqui, se articulasse ao neofascismo, que emergiu das sombras obscurantistas em que se encontrava, e ambos difundiram-se e ganharam força pelas narrativas via redes sociais. Disso resultaram trágicos eventos: impeachment da Dilma sem crime; “Ponte para o Futuro” do Governo Temer e a retirada de direitos que ela fez,[vi] criação da Lava Jato, que prendeu Lula (07/04/2018) e o impediu de concorrer às eleições, manipulando mecanismos judiciais para tanto (Lawfare); eleição de Jair Bolsonaro.
Eleito, Jair Bolsonaro e o governo que ele constituiu consolidaram o neofascismo como força política de massa no Brasil. A propósito, o lema do governo desde a campanha eleitoral é “Deus, pátria e família”, uma reprodução ipsis litteris do lema fascista, traduzido no Brasil na primeira metade do século XX pelo Integralismo e retomado pelo bolsonarismo atualmente (ALMEIDA, 2022). Eles foram competentes o suficiente para articular um bloco de forças que ganhou as eleições de 2018 e sustentou o governo, que quase foi reeleito em 2022. Desse bloco participam, entre outros: setores da classe média urbana; grupos sociais rurais e ligados ao agronegócio; grande parte das forças armadas do Estado; sujeitos da estrutura jurídica do Estado; fundamentalistas religiosos (principal/e de igrejas cristãs pentecostais e mesmo de setores católicos conservadores); empresários(as) neofascistas; setores da mídia “tradicional”.
No processo de destruição neofascista, emergiu um núcleo que apoia Jair Bolsonaro em toda circunstância e o toma como líder (“mito”), comportando-se como seita. Mais pela emoção do que pela razão, esse núcleo foi mobilizado e os(as) que o integra, só ouve, lê e assiste o que os(as) nele internalizados(as) indicam nas redes sociais. Isso lhes possibilita romper “filtros sociais” e psicológicos que os impediam de externalizar o ódio a tudo e a todos(as) que lhes são diferentes.
Embora as redes sociais possam ser (e são!) utilizadas com propósitos humanitários e civilizatórios, são presididas por uma lógica de funcionamento que atenta contra a humanidade e a civilidade democrática, o que é duplamente interessante a muitos super ricos proprietários de plataformas: primeiro, porque vai ao encontro da ideologia de alguns deles, próximos ao neofascismo (vide Elon Musk, dono do Twitter), e segundo porque o ódio gera mais engajamento (RATHJE; BAVEL; LINDEN, 2021) e, portanto, mais lucros.
A dinâmica de uso e abuso das narrativas via redes sociais torna impossível o diálogo racional, baseado em fatos. Isso não é novidade pois, historicamente, nunca foi possível a “escuta democrática” com fascistas. Na relação interpessoal e social, eles(as) criam tensões com a comunicação violenta, identificam inimigos a destruir virtual (“cancelamento”) e fisicamente.
Jair Bolsonaro no governo, tentou destruir por dentro o mínimo da institucionalidade democrático-burguesa que havia no Brasil: empossou mais de oito mil militares, muitos(as) dos(as) quais locupletando-se com duplo salário e “fugindo” do que a Reforma da Previdência (Emenda Constitucional 103/2019) previu aos demais setores sociais; colocou neófitos em posições estratégicas, inclusive no Ministério da Saúde durante a pandemia; deu posse a uma antifeminista no Ministério da Mulher; nomeou um racista à Fundação Palmares e ignorantes no MEC, incultos no Ministério da Cultura, condenado por crime ambiental no Meio Ambiente. De fato, “Quando as angústias, incertezas, dores, tristezas e frustrações ocorrem sem sustentação coletiva de vida partilhada, há uma quebra na experiência humana, facilitando a captura exercida por discursos do ódio que defendem a destruição de pessoas e instituições” (MACHADO; FONSECA, 2023).
Esse processo de neofascistas assumirem um Estado do porte do brasileiro, teve repercussões profundas no espectro político-ideológico nacional: os(as) progressistas entraram em refluxo, os(as) conservadores(as) foram engolidos pelo bolsonarismo e os(as) reacionários(as)[vii] tornaram-se força político-ideológica com significativa base social. E é justamente por isso que a vitória de Lula em 2022 foi gigantesca, com ressonância internacional.
Interessa observar que todo esse “caldo” econômico, político-ideológico, cultural e social, do qual Jair Bolsonaro e o bolsonarismo é produto e produtor,[viii] efetiva-se em pautas defendidas com vigor e sem nenhum prurido pelos(as) neofascistas, e elas são justamente o contrário do que representa a escola na mentalidade popular.
Quadro 2 – Pautas do neofascismo em oposição à imagem das escolas no senso comum
Fonte: produzido pelo autor do artigo
Assim, no argumentado até aqui e no que é exposto no Quadro 2 encontra-se a validação da tese de que os atentados contra escolas foram insuflados pela cultura de ódio e violência propagada pelos neofascistas via redes sociais e que as escolas têm sido alvo preferido deles(as) porque elas representam a negação de tudo o contém as pautas que defendem.
A “violência nas escolas” e a “violência contra escolas”
Não é preciso muito esforço intelectual para saber que as escolas não são o “mar de rosas” idealizado pelo senso comum. Como a violência é um problema social, a escola não é imune a ela. Há violências de diversos tipos nas escolas. A novidade que se vivencia com o neofascismo é que se passou a ter também a “violência contra escolas”, na forma de atentados.
São fartos os dados da realidade que revelam as violências na escola.
Quadro 3 – Alguns dados sobre as violências nas escolas antes dos atentados neofascistas
Fonte: produzido pelo autor do artigo
Além das violências sofridas pelos(as) sujeitos(as) escolares, há até mesmo violência praticada pelas instituições escolares contra eles, que se manifesta na forma de pedagogias autoritárias, gestão não democrática, descumprindo preceitos legais (Art. 14 da LDB – Lei 9394/96 – e Art. 206, Inciso VI da Constituição), não oferta de pessoal, estrutura física e didático-pedagógica adequadas à boa execução do processo de ensino-aprendizagem.
Se a violência nas escolas era problema de monta, ele se agravou com o neofascismo assumindo o Estado brasileiro via bolsonarismo, porque algumas “violências contra escolas” foram praticadas, como por exemplo: apoio à legalização do homeschooling, que se constitui como negação à escola; a implantação das escolas cívico-militares (Decreto 10.004/19), iniciativa do MEC e Ministério da Defesa, que conseguiu implantar 128 escolas em todo o território nacional (CNTE, 2023) das 216 previstas, instituições voltadas à cultura da guerra e ao autoritarismo.
Ao final do ano de 2022 e início de 2023, muitos(as) brasileiros(as) ficaram estarrecidos(as) com uma nova modalidade de “violência contra escolas”: os atentados aos sujeitos escolares de vários níveis de ensino, incluindo creches.
Quadro 4 – Algumas motivações da violência contra escolas e resultados produzidos.
Observe-se que, no atentado de Blumenau, foi utilizado um machado para assassinar crianças de creche. Sabendo que os signos são armas de propaganda e cooptação fascista desde as origens históricas desse movimento, cabe dizer que o machado é um dos símbolos do fascismo: uma machadinha envolta em um feixe de varas (fascio em italiano e fesce em latim), reportando-se ao que oficiais de justiça da Roma Antiga levavam nas mãos para executar ordens.
Para ter recurso humano para praticar “violência contra escolas”, neofascistas empregam “[…] diversos meios e métodos de cooptação, entre eles: uso de humor; uso de estética e linguagem violentas como a linguagem da machosfera; trollagem; uso de jogos online como Roblox, Fortnite, Minecraft; uso de imagens de ataques e compartilhamento de manifestos de atiradores como método de propaganda; etc.” (CARA, 2022, p. 4). Não existia registro desse tipo de atentado contra escolas antes do ano 2000, mas de setembro de 2022 a abril do corrente ano foram 5 atentados, com 11 vítimas fatais.
Algumas orientações para enfrentar a “violência contra escolas”
Deparando-se com a trágica e inusitada “violência contra escolas”, muitos(as) ingenuamente ou seduzidos(as) pela resposta anti-humanista de viés neofascista, pensam ser necessário empregar mais violência para combater esse tipo de violência. Ledo engano! Isso não funciona, como demonstra experiências históricas como a dos EUA, justamente o país que Bolsonaro admira e diz querer copiar no Brasil.
Os EUA possui “46% das 857 milhões de armas de fogo nas mãos de civis no mundo todo, embora representem apenas 4% da população mundial […] há 120,5 armas de fogos ‘civis’ registradas por cada 100 habitantes” (AGÊNCIA EFE, 2018), lidera o ranking de violência por armas de fogo entre países desenvolvidos (NORTE, 2016), teve, de 01/01 a 27/03/2023, 131 casos de “tiroteios em massa” (4 ou mais pessoas são mortas ou feridas), média de 1,5 casos por dia, sem que o incremento da força policial, da instalação de artefatos de segurança nas escolas, inclusive, com contratação de vigilantes privados (política de “tolerância zero” depois do “Massacre em Columbine”), fizesse reduzir os casos de atentados contra elas (SANCHES, 2023) e que produziram, segundo Dados levantados pelo Washington Post até maio de 2022, indicam que nos EUA foram: (i) 554 vítimas ao todo, 185 mortos e 369 feridos em ataques violentos às escolas; (ii) 331 escolas atacadas; (iii) 2021 foi o ano com o maior número de eventos, com 34 incidentes; (iv) 311 mil crianças em idade escolar nos EUA foram afetadas pelos tiroteios ou expostas a violência armada. (CARA, 2022, p. 4).
De fato, “A inserção nas escolas de artefatos de segurança, tais como catracas e seguranças armados, não vai enfrentar o impacto do extremismo de direita nos jovens e, pelo contrário, tende a aumentar as ameaças, bem como ocasionar riscos de novos atentados” (CARA, 2022, p. 6). Na verdade, “[…] um ataque à escola serve à barbárie” (MACHADO; FONSECA, 2023); logo, não se pode apelar à barbarização ao responder à “violência contra escolas”. E nem culpabilizá-las, com “[…] indagações sobre o que a escola fez ou deixou de fazer” (MACHADO; FONSECA, 2023). Que fazer, então, com os casos de “violência contra escolas”?
Há experiências internacionais importantes, como é o caso do “[…] projeto EXIT, idealizado e concretizado na Noruega, desde 1997, tido pela Relatoria de Direitos Humanos da ONU como um dos mais efetivos e eficazes projetos destinados à desvinculação dos grupos extremistas de direita que fomentam o ódio” (CARA, 2022, p. 8). Além disso, e considerando ser esse problema de origem multicausal e, portanto, que demanda abordagem intersetorial, deve-se cuidar das escolas e seus sujeitos e combater o neofascismo na sociedade.
Interessa observar que, com a mudança de governo, com Lula na Presidência, o enfrentamento ao problema se intensificou, produzindo alguns parcos, mas importantíssimos resultados: até 18/04/2023, por ação do Ministério da Justiça, foram investigados mais de mil casos potenciais de atentados contra escolas, removidos 756 perfis das redes sociais por promoção do ódio, com 225 pessoas presas ou apreendidas, o que inviabilizou os atentados prometidos por fascistas nas redes sociais para o dia 20/04/2023 (dia de nascimento de Hitler e do “Massacre em Columbine”, ocorrido em 20/04/1999: 2 alunos do Ensino Médio mataram 12 alunos e 1 professor, e na fuga feriram mais 21). Mas é preciso avançar ainda mais.
Quadro 5 – Proposição de ações para combater a “violência contra escolas”.
Fonte: produzido pelo autor do artigo
À guisa de conclusão
Como conclusão, cabe retomar ideias apresentadas neste texto, com vistas a salientá-las. E a primeira delas é que a escola não é uma instituição isolada do contexto, de modo que o que nela ocorre está dialeticamente articulado à dinâmica da totalidade da vida social.
Se é assim e se a sociedade atual é violenta, a escola não poderia deixar de sê-la. Contudo, há diferentes violências que a atingem e seus sujeitos, sendo a chamada neste texto de “violência contra escolas” algo inédito no Brasil. Cabe, portanto, envidar esforços para conhecer esse problema e bem encaminhar a superação dele, com vistas a construir uma civilidade brasileira realmente democrática, isto é, não sustentada nos preceitos fascistas, seja o histórico, seja o adaptado ao contexto nacional pelo bolsonarismo.
Está em curso esse processo de conhecimento e encaminhamento de solução ao problema da “violência contra escolas”, mas cabe reforçar que não é possível tomar como paradigma experiências internacionais fracassadas, como a dos EUA, e nem culpabilizar escolas e seus sujeitos, colocando sobre eles(as) o ônus da solução do problema.
Sabendo que a estratégia dos(as) neofascistas é criar o problema (uma nova modalidade de violência, a “violência contra escolas” via atentados contra sujeitos da comunidade escolar) e oferecer solução na forma de mais violência, acirramento do ódio entre alunos(as), professores(as) e demais profissionais da educação escolar, cabe aos(às) não fascistas tomar a “violência contra escolas” como problema de origem multicausal e, assim, adotar como caminho superador a abordagem intersetorial.
Por ela, todos os setores sociais devem empreender a luta para fazer da escola, bem como da sociedade brasileira, um espaço plural, democrático, que garanta os direitos humanos fundamentais a todos(as). Para tanto, há muito que fazer, inclusive, legislar, embora já hajam dispositivos legais que precisam ser colocados em prática, como é o caso da gestão democrática das escolas.
*Artigo publicado originariamente no site A TERRA É REDONDA, de autoria de Marcos Francisco Martins, Professor da Faculdade de Educação da UFScar – Campus Sorocaba.
Referências
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Notas
[i] O termo “neofascismo” é adotado neste texto para caracterizar o movimento liderado por Bolsonaro. Isso porque se entende que o “fascismo histórico” (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO; 1992, p. 466) tem sofrido adaptações consideráveis sob a égide bolsonarista, como o “entreguismo”: o fascismo foi nacionalista, a ponto de causar guerras entre nações, mas Bolsonaro e o governo dele submeteram-se ao imperialismo e entregaram o patrimônio nacional.
[ii] Observe-se que a consolidação do modo de produção capitalista, superando o feudal, se deu fruto de três grandes movimentos, entre outros de menor monta: a alteração da mentalidade medieval pelo Iluminismo (séc. XVII e XVIII); a transformação da dinâmica política pelas revoluções na Inglaterra (1640 a 1688), nos EUA (1776) e, mormente, na França (1789); a modificação econômica e social produzida pela Revolução Industrial (séc. XVIII e XIX).
[iii] A Reforma do Ensino Médio, inicialmente apresentada autoritariamente como Medida Provisória (746/2016) e posteriormente transformada em Lei (13.415/2017), é exemplo acabado de política pública educacional de cunho neoliberal, daí os(as) não neoliberais entenderem que não cabe reformá-la, mas revogá-la.
[iv] É difícil identificar a pós-modernidade, porque é um movimento intelectual, filosófico, científico, artístico… multívoco, havendo dentro dele até mesmo um “pós-modernidade” de libertação, segundo Freitas (2005). Neste artigo, se está trabalhando com o que se acredita serem as características mais marcantes desse movimento, como as citadas.
[v] Neste texto, a palavra narrativa é concebida com significado e sentido empregado pelo senso comum e com o alcance que ganhou na fala de pessoas de vários níveis culturais no Brasil atualmente, e não da forma como é apropriada pelas ciências humanas e sociais. Nelas, as narrativas são, por vezes, concebidas como técnica/instrumento/processo de coleta de dados sobre um fenômeno em vários campos do saber, como nas pesquisas em educação, por exemplo (PRADO e outros; 2015).
[vi] Apenas para ficar em três exemplos: “Teto de gastos” (Emenda Constitucional 95/2016); Reforma trabalhista (Lei n 13.467/2017); Reforma do Ensino Médio (Lei nº 13.415/2017).
[vii] Para saber sobre o conceito de progressista, conservador(a) e reacionário(a) que se está empregando aqui, confira Martins (2022). Em relação ao último desses grupos, que é o que está em questão neste texto, cabe complementar que “Esses grupos, aponta Junqueira (2018), buscam a promoção de uma agenda política moralmente regressiva, especialmente (mas não apenas) orientada a conter ou anular avanços e transformações em relação a gênero, sexo e sexualidade, além de reafirmar disposições tradicionalistas, pontos doutrinais dogmáticos e princípios religiosos ‘não negociáveis’” (CARA, 2022, p. 3).
[viii] Evidências disso são a liberação dos Clubes de Tiro, que têm até mesmo recebido crianças para cursos de formação (ESTEVES, 2023); a regulamentação dos CAC (Colecionadores, Atiradores desportivos e Caçadores); 1.354.751 novos armamentos entraram em circulação (OLIVEIRA, 2023) entre 2019 e 2022 (as armas nas mãos da população civil supera em 7,5 vezes o total de armas vinculadas às forças estatais de segurança pública). “O número de armas nas mãos da população civil hoje supera em 7,5 vezes o total de armas vinculadas às forças estatais de segurança pública. O crescimento de registro de armas de fogo vem acompanhado do aumento do quantitativo de munição comercializada no mercado nacional. Esses números representam o resultado da política de armamento da população civil adotada pelo Governo Bolsonaro, a exemplo do Decreto nº 9.847/2019.” (CARA, 2022, p. 6)
[ix] “[…] a misoginia exerce um papel crucial no processo [de atentados contra escolas]. Não à toa, mulheres são alvos frequentes de atiradores em massa.” (CARA, 2022, p. 4)
[x] Jovens e adolescentes, no processo de amadurecimento moral, têm necessidade de se sentir parte de um grupo para se fortalecerem, o que ocorre em coletivos neofascistas virtuais, a partir do ódio às mesmas coisas e pessoas. Integrados(as) a tais grupos, eles(as) se sentem reconhecidos pela identidade comum.
[xi] “É necessário compreender que o processo de cooptação pela extrema-direita se dá por meio de interações virtuais, em que o adolescente ou jovem é exposto com frequência ao conteúdo extremista difundido em aplicativos de mensagem, jogos, fóruns de discussão e redes sociais.” (CARA, 2022, p. 3)
[xii] “Dos Princípios e Fins da Educação Nacional – Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”
[xiii] “Autores definem que, após um atentado na escola, deve-se fazer uma avaliação para determinar quais os alunos que mais precisarão de suporte (mais intenso e longitudinal) e quais serão os suportes universais (psicossociais) que devem ser dirigidos a toda a comunidade escolar.” (CARA, 2022, p. 5)
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